sábado, 11 de abril de 2009

Penjing, Eugênia e Lago

Texto e Fotos: Marcelo Duprat

Este trabalho foi desenvolvido a partir de uma muda de Eugenia myriophylla obtida em horto e atualmente com a altura de 30 cm. Devido a dificuldade de encontrar informações sobre esta espécie cabe uma pequena introdução para esclarecer as opções escolhidas no decorrer do processo.

A planta, da família das mirtáceas, gosta de bastante luz, mas não de sol direto nos horários de maior intensidade. Prefere clima ameno e suporta solo relativamente seco. Têm a característica de ramificar abundantemente em determinado ponto. São bastante apreciadas em topiarias comuns de jardim, para formação de cercas e maciços, pois possibilitam a formação de copas com formas bem desenhadas. De fato, a tendência da espécie em formar copas densas é enorme. Normalmente estas copas são tão cerradas que não deixam a luz do sol entrar em seu interior, o que faz com que as folhas internas sequem muito rapidamente. Para a formação de um penjing ou bonsai isto, entretanto, se mostra problemático, pois as copas tendem a crescer em sua superfície e secar em seu interior, aumentando assim o seu volume constantemente. Esteticamente a ramificação abundante em determinado ponto é também uma característica típica dos arbustos e não das árvores antigas. A espécie, portanto, impõe um esvaziamento constante das copas com a eliminação dos ramos excessivos.

Outra característica importante da espécie é que recebendo sol em seu interior, as eugênias brotam facilmente em tronco de qualquer idade. Entretanto, demora para que o novo broto se harmonize com a espessura do antigo. O engrossamento do tronco e galhos, assim como a fixação de ramos aramados demanda mais tempo do que na maioria das espécies utilizadas para bonsai e penjing.

Todo o trabalho desenvolvido levou em consideração estas características e pode ser resumido como um constante esvaziar da planta, aproveitando, a cada etapa, o mínimo suficiente de ramos que a planta tinha a oferecer para a formação de determinada configuração da copa. Ainda hoje me impressiona a grande quantidade de material retirado a cada poda, por vezes com ramos antigos, sem que isso altere significativamente a configuração geral da copa.


A primeira intervenção, efetuada em setembro de 2005, foi a alteração do pivô central através de uma mudança de inclinação do tronco. Na primeira foto se podem ver os cinco ramos originais bifurcados na mesma altura do tronco. Três meses depois, após as devidas aramações, a configuração geral da copa já estava bastante adiantada (abaixo).


Janeiro de 2006

A planta me sugeria uma árvore frondosa com parte de sua copa projetada sobre um lago. Como não havia de minha parte pretensão de engrossar mais o tronco preparei o primeiro suiban com o objetivo de desenvolver um Penjing. Foi feito de cimento branco e modelado a partir de uma fôrma de gesso com a proporção de 45 x 30 cm. Também as pedras, neste primeiro momento, foram totalmente feitas de cimento, devidamente pintadas durante o processo de secagem com pigmentos resistentes a luz solar. Tendo por base os princípios de água e terra, busquei equilibrar os dois volumes dividindo-os com o conjunto das pedras.


A princípio me pareceu satisfatório, mas esta versão não resistiu por muito tempo. O volume coeso e compacto da copa, ocupando toda a extensão do suiban, configurava uma árvore muito grande para a paisagem. Deveria optar por diminuir a árvore ou aumentar o suiban. Neste momento também se tornaram claros os elementos que deveriam ser harmonizados – planta, terra, pedra, água, ar e porventura um elemento escultórico para favorecer a proporção e clima que se apresentava.


O segundo suiban, um pouco maior, 57 x 32 cm, foi feito também de cimento branco, mas modelado manualmente. As pedras claras, de tom similar ao do tronco, foram coletadas e somente as junções e assentamentos foram feitos com cimento (pintados como anteriormente, mas imitando a cor e veios das pedras utilizadas).

O movimento do conjunto foi todo voltado para a área de água. Coloquei uma pedra alta e com tampo chato ao fundo do lado direito. A idéia foi que ao redor do tampo estivesse o volume mais alto de substrato. Criou-se assim uma descida entre este ponto e o volume mais baixo da praia, deliberadamente mais próxima do plano do suiban.

Este volume mais alto de substrato foi contido por um lado pela pedra e por outro pelas raízes mais vigorosas do lado direito da eugênia, criando assim uma espécie de degrau que valoriza e justifica as raízes. Com isso o tronco ficou também um pouco mais enterrado diminuindo visualmente sua proporção. Ao lado uma foto logo após o transplante.

Este novo elemento, a praia, também daria uma maior liberdade de acomodação das pedras com o torrão de raízes, pois a praia constituía um elo facilmente modelável na hora do transplante. Foi feita com areia misturada com silicone, o mesmo utilizado para assentar as pedras no suiban e isolar a área da água da área do substrato. Ao lado um exemplo de como uma placa bem fina da mistura se mantém com um aspecto natural.

O bode, modelado em arame e durepox, entrou como um elemento escultórico cujo movimento do corpo e do olhar também estão voltados para a área da água. Por sua vez os chifres voltados para trás se harmonizam com os ramos do lado direito da árvore criando assim uma identidade com o conjunto.


Janeiro de 2007

Mas confiante das características da planta comecei a subdividir a copa em patamares tentando manter sua dinâmica geral. Cabe aqui nos estendermos um pouco mais para que se veja como as eugênias são maravilhosas no quesito de formação das copas. A princípio criei diversas faixas horizontais e logo percebi que havia um vazio que atravessava o conjunto em um ritmo similar ao movimento geral do penjing.

Mas desde o início havia sentido a conveniência de um grande vazio do lado direito da planta, localizado sobre a pedra mais alta. O “vazio” do ar e o da água, cada qual de seu lado, se harmonizaram. Para valorizá-lo optei por retirar um dos ramos principais (aponte sobre a imagem acima e veja a linha azul) que já não estava a contribuir em nada na dinâmica geral da copa. Notem que a retirada deste galho não alterou muito a dinâmica do conjunto pois havia material suficiente no galho de cima para substittui-lo.

Busquei também criar uma dinâmica de vazios nas copas voltados para o vazio sobre a pedra ao invés de acompanhando o movimento do galho em queda...


Matéria extraída da revista eletrônica A Arte Bonsai
(http://www.artebonsai.com.br)

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